Angela Davis reconhece resultados positivos de cotas nas universidades, em coletiva na UFBA

Angela Davis reconhece resultados positivos de cotas nas universidades, em coletiva na UFBA

25/07/2017 - 19h07
A professora e ativista refletiu sobre temas variados

O efeito positivo da política de cotas raciais nas universidades brasileiras; o apoio que a universidade pode dar aos membros de sua comunidade na luta antirracista e antissexista; um alerta contra a tentativa de resolver problemas de violência com punições de encarceramento que geram mais violência e a necessidade de dar continuidade aos movimentos em prol da libertação de presos políticos foram os pontos mais destacados pela filósofa e ativista norte-americana, Angela Davis, durante entrevista coletiva concedida à imprensa, na tarde desta terça-feira (25/07), na sala dos Conselhos Superiores da Reitoria da Universidade Federal da Bahia.  

Davis – que veio à Bahia a convite do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM/UFBA), em parceria com o Grupo de Pesquisa Coletivo Angela Davis da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e a organização Odara - Instituto da Mulher Negra – também teceu analogias entre o sistema carcerário e a escravidão e enalteceu a arte e a estética como expressão política, principalmente na Bahia, lugar onde “a música e as artes já revelam o envolvimento de uns com os outros”, acentuou a professora.

A passagem da professora despertou o interesse de jornalistas dos mais diversos veículos de comunicação que lotaram o espaço da entrevista a fim de apresentar vriados  questionamentos, relacionados às pesquisas realizadas pela filósofa.  A atividade que aconteceu antes da conferência agendada para o início da noite, no Salão Nobre da Reitoria, também foi mais um momento de celebração do Dia da Mulher Negra, Americana, Latina e Caribenha, enfatizado por Davis.

 

Universidade, liberdade de justiça

Ao analisar a importância das políticas afirmativas, a ativista comparou os resultados das lutas encampadas pelos movimentos sociais nos Estados Unidos e no Brasil e reconheceu “o quanto são ínfimos lá, mas já podem ser visíveis e perceptíveis por aqui, principalmente, pelas cotas raciais de acesso às vagas nas universidades”.  Visivelmente impactada, ela citou sua experiência positiva ao ministrar, na semana passada, um curso no campus da UFRB, na cidade de Cachoeira e fez referência ao início das discussões pelas cotas raciais na UFBA, há quase 13 anos.  Para Davis, as cotas nas universidades são importantes, pois são instituições que em si, já são ligadas às elites e por isso, transformam-se em espaço de lutas e arenas de disputa. “Então, é importante que a universidade dê apoio aos seus membros, na luta antirracista e antissexista, o que “levará à liberdade e justiça para todos”.

 

Encarceramento e escravidão

Preocupada com o modo como “a punição associada ao aprisionamento mantém ligações óbvias como o sistema escravocrata”, a ativista que estuda o tema há cerca de três décadas, afirmou categoricamente que “o encarceramento nunca resolveu os problemas para os quais pressupõe-se que seria a resposta”.  Davis foi além e acrescentou que “as pessoas saem mais violentas do que eram, antes de serem presas” e “nenhuma proposta de reforma seria capaz de banir o racismo e a repressão que são reproduzidas na estrutura dos cárceres”, por isso, ela defendeu a “necessidade de adotarmos uma abolição carcerária como forma de punição”.  Esta abolição, segundo ela, significaria “uma sociedade livre de racismo, com educação livre e acesso igualitário de toda população ao sistema de saúde”.  

Ela chamou atenção para a necessidade dos movimentos feministas, que desempenham um papel crucial no enfrentamento da violência de gênero, adotarem uma abordagem abolicionista, o que, certamente, significaria uma minimização da gravidade da violência doméstica, pois “que poder de transformação existe em enviar um homem que exerceu violência contra a mulher para um sistema que reproduz a violência?”. Então, a ativista sugeriu que, para “expurgar” a violência, como um todo de nossas sociedades, seria necessário encontrar novas formas de responsabilizar seus autores e não se utilizar-se da "ferramenta de vigança, que são os cárceres".   

Ao fazer comparações entre a situação carcerária dos Estados Unidos e Brasil, a professora destacou que ambos estão entre os quatros países (EUA, Rússia, China e Brasil) com maiores populações carcerárias do mundo, chamando atenção para o fato de que, no Brasil, pouco mais de dois terços são compostos por pessoas negras e de baixa renda.  Tal estatística não está relacionada somente aos encarcerados do sexo masculino, aplica-se também às mulheres presas que, em sua maioria,  são negras, disse.  Angela também lembrou que as mais variadas formas de violências atingem imensamente essas mulheres e nas formas mais íntimas – como as revistas invasivas para aquelas que vão visitar seus companheiros e no ambiente doméstica, como reflexo da punição imposta aos homens de seus círculos familiares. 

A professora que foi encarcerada na década de 1970, devido ao seu ativismo político em defesa dos direitos civis das pessoas negras, também destacou a necessidade de dar continuidade aos movimentos em prol da libertação dos presos políticos no Brasil, Estados Unidos, Israel e países da Europa, principalmente os que lutam contra os regimes totalitários.  Neste sentido, ela pediu que sejam realizados esforços para a libertação do brasileiro Rafael Braga, único condenado por participar das manifestações de 2013.  

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